Site revela que Moro orientou MPF a fazer nota logo após depoimento de Lula, em 2017

O site The Intercept divulgou nesta 6ª feira (14.jun.2019) novas conversas do ex-juiz federal e atual ministro da Justiça, Sergio Moro, com integrantes da força-tarefa da operação Lava Jato. Nos diálogos, 1 dia depois do 1º depoimento de Luiz Inácio Lula da Silva em Curitiba, Moro orienta o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima a emitir uma nota à imprensa como resposta ao que classificou como “showzinho” da defesa do ex-presidente.

A conversa teria sido realizada em 10 de maio de 2017 e foi iniciada por Moro. Ele pergunta ao procurador: “O que achou?”, referindo-se ao depoimento de Lula. Santos Lima faz a sua avaliação, os dois trocam mais algumas mensagens, até que o então juiz fala: “Talvez vcs devessem amanhã editar uma nota esclarecendo as contradições do depoimento com o resto das provas ou com o depoimento anterior dele. Por que a Defesa já fez o showzinho dela”.

O procurador, então, pede em 1 grupo em que estão assessores de imprensa do MPF (Ministério Público Federal) que eles tentem agendar uma entrevista com a Rede Globo, em Recife, onde ele participaria de 1 congresso jurídico. Os assessores tentam dissuadi-lo.

Na sequência, Santos Lima copia as mensagens que recebeu de Moro em uma conversa privada com Deltan Dallagnol. Depois, é o coordenador da força-tarefa da Lava Jato quem envia uma mensagem no grupo de assessores do MPF, pedindo para que eles avaliassem a repercussão do caso e considerassem a ideia de emitir uma nota para “contrabalancear as manifestações da defesa”. Recebe como resposta de que poderia ser 1 “tiro no pé”.

As trocas de mensagens seguiram até o dia seguinte, quando a comunicação emitiria, de fato, uma nota, conforme orientação de Moro.

Confira as mensagens divulgadas:

  • Moro pergunta a Santos Lima o que ele achou do depoimento

Santos Lima – 22:10 – Achei que ficou muito bom. Ele começou polarizando conosco, o que me deixou tranquilo. Ele cometeu muitas pequenas contradições e deixou de responder muita coisa, o que não é bem compreendido pela população. Você ter começado com o Triplex desmontou um pouco ele.
Moro – 22:11 – A comunicação é complicada pois a imprensa não é muito atenta a detalhes
Moro – 22:11 – E alguns esperam algo conclusivo
Moro – 22:12 – Talvez vcs devessem amanhã editar uma nota esclarecendo as contradições do depoimento com o resto das provas ou com o depoimento anterior dele
Moro – 22:13 – Por que a Defesa já fez o showzinho dela.
Santos Lima – 22:13 – Podemos fazer. Vou conversar com o pessoal.
Santos Lima – 22:16 – Não estarei aqui amanhã. Mas o mais importante foi frustrar a ideia de que ele conseguiria transformar tudo em uma perseguição sua.

  • Dez minutos depois, Santos Lima envia mensagem no grupo “Análise de clipping”, em que estão assessores de imprensa do MPF

Santos Lima – 22:26:23 – Será que não dá para arranjar uma entrevista com alguém da Globo em Recife amanhã sobre a audiência de hoje?
Assessor 1 – 22:28:19 – Possível é, só não sei se vale a pena. E todos os jornalistas que estão aqui e já pediram entrevista?
Assessor 2 – 22:28:32 – Mas dr., qual o motivo?
Assessor 2 – 22:29:13 – Qual a necessidade, na realidade..
Santos Lima – 22:30:50 – Uma demanda apenas. Como está a repercussão da coletiva dos advogados?
Assessor 2 – 22:30:58 – Rito normal do processo…vcs nunca deram entrevista sobre audiência…vai servir pra defesa bater…mais uma vez…

  • Santos Lima envia as mensagens que recebeu de Moro para Dallagnol. O coordenador da Lava Jato não vê. No grupo “Filhos de Januário 1”, integrantes da força-tarefa discutem se deveriam comentar o depoimento. Santos Lima envia uma mensagem ao grupo para que Dallagnol veja seu chat privado. No grupo, o coordenador responde.

Deltan – 22:46:46 – Então temos que avaliar os seguintes pontos: 1) trazer conforto para o juízo e assumir o protagonismo para deixá-lo mais protegido e tirar ele um pouco do foco; 2) contrabalancear o show da defesa.
Deltan – 22:47:19 – Esses seriam porquês para avaliarmos, pq ng tem certeza.
Deltan – 22:47:50 – O “o quê” seria: apontar as contradições do depoimento.
Deltan – 22:49:18 – E o formato, concordo, teria que ser uma nota, para proteger e diminuir riscos. O JN vai explorar isso amanhã ainda. Se for para fazer, teríamos que trabalhar intensamente nisso durante o dia para soltar até lá por 16h

  • Dallagnol conversa com Moro

Deltan – 23:02:20 – Caro parabéns por ter mantido controle da audiência de modo sereno e respeitoso. Estamos avaliando eventual manifestação. A GN acabou de mostrar uma série de contradições e evasivas. Vamos acompanhar.
Moro – 23:16:49 – Blz. Tb tenho minhas dúvidas dá pertinência de manifestação, mas eh de se pensar pelas sulilezas envolvidas

  • Dallagnol manda mensagens no grupo “Análise de clipping”

Deltan – 23:05:51 – Caros, mantenham avaliando a repercussão de hora em hora, sempre que possível, em especial verificando se está sendo positiva ou negativa e se a mídia está explorando as contradições e evasivas. As razões para eventual manifestação são: a) contrabalancear as manifestações da defesa. Vejo com normalidade fazer isso. Nos outros casos não houve isso. b) tirar um pouco o foco do juiz que foi capa das revistas de modo inadequado.
Assessor 2 – 23:15:30 – Quem bate vai seguir batendo. Quem não bate vai perceber a mudanca de posicionamento e questionar. É uma parte do processo. Na minha visão é emitir opinião sobre o caso sem ele ter conclusão…e abrir brecha pra dizer que tão querendo influenciar juiz. Papel deles vai ser levar pro campo político. Imprensa sabe disso. E já sabe que vcs não falam de audiências geralmente. Mudar a postura vai levantar a bola pra outros questionamentos. Pq resolveram falar agora? Pq era o ex-presidente? E voltar o discurso de perseguição…é o que a defesa fez, faz…pq não tem como rebater a acusação. Acusação utilizar da mesma estratégia pode ser um tiro no pé.

  • No dia seguinte, depois de a Lava Jato publicar a nota, Dallagnol conversa com Moro

Deltan – 22:16:26 – Informo ainda que avaliamos desde ontem, ao longo de todo o dia, e entendemos, de modo unânime e com a ascom, que a imprensa estava cobrindo bem contradições e que nos manifestarmos sobre elas poderia ser pior. Passamos algumas relevantes para jornalistas. Decidimos fazer nota só sobre informação falsa, informando que nos manifestaremos sobre outras contradições nas alegações finais.

REPERCUSSÃO DO CASO
No último domingo (9.jun), o Intercept divulgou uma série de mensagens em que Moro parece orientar a força-tarefa da Lava Jato quando ainda era juiz federal e responsável pelo julgamento dos casos da operação em Curitiba.

Após a publicação da reportagem, o ministro disse não ter visto “nada de mais” nas conversas. Nessa 5ª, ele ainda afirmou não temer a divulgação de novos diálogos e não lembrar-se de todas as falas atribuídas a ele. Assim como o MPF, Moro também alegou ter sido vítima de 1 ataque hacker.

Na manhã desta 6ª, Moro disse que pode ter cometido 1 “descuido formal” ao indicar uma testemunha no caso do tríplex, que culminou na prisão de Lula.

Ainda no domingo, Moro também criticou o Intercept por não tê-lo procurado antes da publicação da reportagem. No texto desta 6ª, o portal diz ter entrado em contato com o ministro e recebido a seguinte resposta: “O Ministro da Justiça e Segurança Pública não comentará supostas mensagens de autoridades públicas colhidas por meio de invasão criminosa de hackers e que podem ter sido adulteradas e editadas, especialmente sem análise prévia de autoridade independente que possa certificar a sua integridade. No caso em questão, as supostas mensagens nem sequer foram enviadas previamente”.

(Fonte: Poder 360)